Muito se fala em mudanças climáticas, mas quando pensamos sobre isso, as imagens que nos ocorrem mais frequentemente são de geleiras derretendo, poluição do ar e do mar, florestas queimando ou mudança no padrão de chuvas.
Algumas pessoas pensam também em seus impactos na saúde como agravamento da asma e alergias, estresse relacionado ao calor, doenças transmitidas por alimentos ou água e problemas relacionados a tempestades, inundações ou secas em comunidades com poucos recursos sendo as mais afetadas.
Para além das implicações econômicas, políticas e ambientais as conexões com a saúde mental começam a fazer parte da discussão: estresse, depressão, ansiedade, prejuízo nas relações sociais e comunitárias vem associados a aumentos de violência e crime.
De acordo com uma pesquisa Gallup, 36 por cento dos americanos dizem que se preocupam "muito" com o aquecimento global, e 35 por cento dizem que acreditam que isso "representará uma séria ameaça" para eles ou seu modo de vida [Gallup]. Estudos também mostram que as mulheres se preocupam mais com o meio ambiente do que os homens [International Herald Tribune].
Em 2017 a American Psychological Association e a ecoAmerica patrocinaram o relatório, Saúde Mental e Mudanças Climáticas: impactos, implicações e orientação para mitigar as respostas psicológicas às mudanças climáticas, como conflitos, fatalismo, medo, impotência e resignação e construir e apoiar a resiliência mental informando e capacitando os mais diversos setores da sociedade.
Ao longo do relatório, encontramos seis ensaios de profissionais de saúde mental que mergulham em tópicos específicos de especialização em saúde mental e mudança climática.
Os títulos dão a dimensão da importância deste relatório:
A opinião de um psicólogo clínico sobre as mudanças climáticas - Thomas Doherty, PsyDA -Mudança climática é um problema causado pelo homem, que é mais difícil de enfrentar do que desastres que estão além do controle humano. Os profissionais de saúde mental podem ajudar a dar às pessoas uma sensação de poder sobre como respondem.
Saúde mental inuíte (povo indígena) e mudança climática -Ashlee Cunsolo, PhD - Os Inuit são um bom exemplo de comunidades que têm experimentado o sofrimento mental e perda de identidade cultural provocada por uma paisagem e condições ambientais em mudança.
Respostas emocionais das crianças às mudanças climáticas - Elizabeth Haase, MD - Experiência direta e efeitos futuros desconhecidos de as mudanças climáticas podem fazer com que as crianças exibam sintomas de PTSD, como comportamento fóbico, pânico, pesadelos e ansiedade.
Resiliência em face da mudança climática - Victoria Derr, PhD - Pesquisa com uma amostra diversificada de estudantes jovens, de 11 a 15 anos, em Boulder, Colorado, mostrou que as visões dos jovens sobre resiliência derivam de apoios sociais e ambientais complexos.
Encontrando um Lugar para a Psicologia nas Deliberações sobre Mudanças Climáticas - Linda Silka, PhD - A Nova Inglaterra é um exemplo infraestrutural que está em risco de aumento do nível do mar e de oportunidades para psicólogos trabalharem com profissionais em diversas áreas e se prepararem para os efeitos.
Nossa obrigação moral: o dever de advertir e agir - Lise Van Susteren, MD - Um número crescente de Cassandras do clima estão sendo debilitado pela ansiedade sobre danos futuros ao planeta. Onde está o esforço coletivo de saúde para tratar dessa questão? Chegou a hora de os profissionais de saúde mental agirem.
Nosso clima está mudando a uma taxa acelerada e continua a ter profundo impactos na saúde humana. Essa mudança prejudica não só saúde física, mas também saúde mental.
As mudanças climáticas podem afetar diretamente a saúde mental pela exposição a traumas psicológicos e situações estressantes da vida, como as vivenciadas em desastres climáticos cada vez mais frequentes.
Artigo na Revista do Instituto Humanitas Unisinos intitulado “A mudança climática piora a saúde mental” cita que o impacto da perda de vida de pessoas próximas, de propriedades, além de deslocamentos involuntários afetam a percepção de saúde e segurança das pessoas, constituindo fator de risco para estados de ansiedade.
Menciona também um estudo publicado recentemente na cidade de Barcelona, que avalia como estatisticamente significativo, que o aumento da exposição a longo prazo à poluição atmosférica pode aumentar as probabilidades de depressão e o uso de antidepressivos.
Dez anos atrás (2011) um estudo realizado pelo Instituto de Mudanças Climáticas da Universidade Nacional Australiana constatou que as mudanças climáticas afetam a saúde mental provocando stress nos adultos e angústia nas crianças. Segundo o instituto, o abuso de álcool pode ocorrer após eventos climáticos extremos.
Estudo feito pela Universidade de Harvard e pelo Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), publicado em 2017, prevê também que nosso sono irá piorar em função da elevação de temperatura como consequência do aquecimento global.
ECO-ANSIEDADE: UMA DOENÇA QUE VEIO PARA FICAR
As mudanças climáticas causaram um novo distúrbio nas gerações mais jovens, com sintomas que incluem ataques de pânico, pensamentos obsessivos, perda de apetite e insônia,
A revista Psychological Today descreveu a eco ansiedade como sendo “uma desordem psicológica recente e que está afetando um grande número de pessoas devido à crise climática”.
E como isso acontece? A especialista em saúde mental Dra. Susan Kassouf explica: Nós nos dissociamos emocionalmente do dano que infligimos ao meio ambiente, o que significa que separamos o agrupamento psíquico de sentimentos relacionados ao aquecimento global e criamos uma barreira de amnésia para aliviar o sofrimento mental. Dissociar-se é dividir a consciência.
Que outros fatores psicológicos fazem com que nossa resposta às realidades das mudanças climáticas seja lenta? De acordo com Kassouf, parte de nossa luta reside em nossa incapacidade de conceituar como nós, humanos, existimos em relação ao nosso meio ambiente. Estamos separados disso? Em um com isso? Mestre nisso? Nossa incerteza sobre como definir essa relação entre as pessoas e o que o psicanalista Harold Searles chama de “o ambiente não humano” é parte do que impede a abordagem eficaz da mudança climática.
É fácil se sentir vulnerável em face de super inundações, marés altas, secas e tsunamis. Há uma dor imensa envolvida em reconhecer as realidades do aquecimento global. Por trás de nossa dissociação e negação da mudança climática está o medo, talvez a culpa por nossa própria pegada de carbono, até mesmo uma sensação de pavor apocalíptico.
A International Psychoanalytical Association reconhece a mudança climática como “a maior ameaça global à saúde do século 21”, seguida de perto pela guerra nuclear.
Reconhecer o aquecimento global envolve o reconhecimento da mudança na dinâmica de poder entre nós, humanos, e o mundo natural.
Ao reconhecemos as ameaças ecológicas que enfrentamos, devemos também reconhecer como somos incapazes de controlar e dominar a Mãe Natureza.
O artigo cita uma outra matéria publicada no Huffpost intitulada “The Waking Up Syndrome” da psicoterapeuta e ecoterapeuta Linda Buzzell que escreveu com a Dra. Sarah Anne Edwards um ensaio homônimo no qual exploram os estágios pelos quais as pessoas passam ao acordar para a realidade da situação ambiental em rápido agravamento, conforme descrito pela maioria dos cientistas confiáveis. Nosso objetivo é ajudar as pessoas a emergir da negação e enfrentar a realidade, mas não ficar presas ao desespero ou impotência enquanto avançam para a ação construtiva.
O problema é que os humanos são altamente resistentes às mudanças culturais e comportamentais!
A boa notícia, uma vez que nossas ações podem ou não evitar as catástrofes previstas ´é que algumas pessoas, além de fazerem o que podem para resolver problemas, também estão se preparando para a transição para um modo de vida diferente.
Poucos dos nossos problemas podem ser resolvidos por um ou dois indivíduos, mas comunidades inteiras podem se unir para cuidar umas das outras em tempos difíceis.
O movimento de Transição “Transition Net Work” é particularmente útil para reunir cidades e bairros de uma forma positiva para se preparar para a mudança para um modo de vida diferente.
Um estilo de vida mais simples, mais local e conectado à vizinhança pode acabar sendo muito mais satisfatório (e saudável).
O “Transition” se apresenta como um movimento de comunidades se unindo para reimaginar e reconstruir nosso mundo.
Seu site informa ainda que o movimento que vem crescendo desde 2005. É sobre as comunidades se preparando para enfrentar os grandes desafios que enfrentam começando localmente. Ao se unirem, eles podem criar soluções de crowdsourcing.
Eles procuram nutrir uma cultura de cuidado, focada em apoiar uns aos outros, tanto como grupos quanto como comunidades mais amplas.
FONTES:
Mental Health and Our Changing Climate: mental-health-climate.pdf
Instituto Humanitas Unisinos: http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/593145-a-mudanca-climatica-piora-a-saude-mental
Psychology Today: https://www.psychologytoday.com/gb/blog/the-me-in-we/201801/coming-terms-ecoanxiety
Transition Net Work: https://transitionnetwork.org/
Transition US: https://www.transitionus.org/
Comments